quinta-feira, 25 de março de 2010

Incompleto


Um texto recente de Rui Tavares, deputado europeu do Bloco de Esquerda, vindo a lume no "Público" de quarta-feira, 10, ["Boletim de Estrasburgo"] traz, a quem a souber ler, utilíssima informação sobre a realidade [e, especificamente sobre a qualidade!] da democracia nos países do Ocidente, hoje.

A propósito de uma intervençãqo recente do deputado Paulo Rangel do PSD informa Tavares sobre uma figura regimental parlamentar europeia [vagamente equivalente ao chamado 'período de antes da ordem do dia' português, esclarece Tavares] comummente designasda pr "discursos de um minuto" onde são [eu diria, a julgar pelo que o próprio Rui Tavares escreve: de forma completamente avulsa e indiscriminada] abordados temas como a obesidade ou aquele que Rangel abordou envolvendo a questão essencial da liberdade de imprensa nas chamadas democracias parlamentares.

Assuntos referentes, pois, à realidade quotidiana mais próxima e concreta das pessoas, dos cidadãos anónimos, nos diversos países europeus---ou mais precisamente "europeus".

O problema, diz Rui Tavares ainda, é que esta figura regimental onde são abordadas questões importantes da vida das pessoas e das sociedades por elas constituídas, segundo o deputado bloquista apenas [e vou citá-lo] "servem para alinhar ideias, deixá-las registadas [...] mas não tem consequências práticas".

É ainda a figura em causa utilizada, explicita Rui Tavares, "principalmente" para cada deputado "deixar em acta [Tavares escreve "ata" porque aderiu, pelos vistos ao tal "acordo" ortográfico] [1] que falou".

É verdade que existe uma outra figura que Rui Tavares refere como "questão oral à Comissão" que pressupõe, obriga, à aberura de inquérito ou "debate com resolução".

Foi o que fez Rangel quando entendeu levar ao Parlamento Europeu a questão do que entende serem atentados à liberdade de imprensa em Portugal perpetrados pelo actual governo Sócrates?

Não, não foi!

O que Rangel fez foi precisamente utilizar a tal figura meramente "platónica" ou estr[e]itamente "moral" do "discurso de um minuto"---pelo que, opina Tavares, não se justificam, de modo algum, as críticas de que foi alvo por supostamente ter "colocado de risco a nossa economia", como terá dito o pomposo Passos Coelho no seu estilo sempre "verbal e argumentativamente peludo e tão caracteristicamente retórico, ao levar a público, na tal "Europa" a crítica em causa quando o país se achava e acha "sob o olhar das agências de rating".

E o problema reside, em meu entender, exactamente aqui: na existência de figuras regulamentares "estrita ou mesmo estreitamente apenas platónicas e/ou morais" a que os deputados podem recorrer sempre que pretendam apenas e somente "deixar em acta que falaram" sem que o que dizem tenha outras consequências reais para além disso e de utilizarem as próprias instituições do que devia ser a maior democracia do mundo por ser a soma de várias democracias dificilmente conquistadas, digamos assim, à própria História---às suas próprias e, muitas vezes, bem acidentadas Histórias particulares---para "jogos" marginais espúrios que são de mero "arremesso interpartidário" e de "marketing pessoal" [envolvendo a construção de imagens pessoais de rigor e exigência] tendo, porém, para tanto assegurada a completa e, a meu ver: de todo imoral, impunidade em termlos de consequências práticas, efectivas, daquilo que dizem.

Ou seja: na realidade, eles não pretendem mudar seja io que for---e o caso do caso de Rangel é bem esclarecedor.

Rangel é deputado pelo Partido "de" Santana Lopes que asinda há meia-dúzia de dias propôs e viu aprovado no congresso do partido de ambos uma medida que, se não limitava aberrantemente a imprensa, limitava, escandalosamente, a de opinião de cada um; o partrido que pressionou com êxito "uma tal TVI" para que corresse com "um tal Marcelo Qualquer Coisa" que por lá debitava uns comentários que não agradavam ao "tal Lopes" e por aí fora.

Numa palavra: não tenm qualquer autoridade moral para falar de reduções e limitações sejam elas de que espécie forem em matéria de liberdades cívicas---o que, aliásd, nem se reveste, na prática, de uma gravidade por aí além porque não é crível que na "Europa" saibam que é Lopes e o que fez enquanto esteve num governo qualquer numa ponta da Europa chamada Portugal.

Rangel "lembrou-se daquela" porque obviamente lhe dá jeito na guerra que o "pê-ésse-dê", agora que se viu livre de Ferreira Leite e que pretende que acreditemos ter encontrado um "espírito" novo, quer travar com o "pê-ésse" e percebe que "aquela" do Face Oculta ainda lhe pode render dividendos sem o obrigar rigorosamente a coisa alguma.

Se Rangel levasse a sério a luta contra o estúpido autoritarismo do poder político actual e a sua escandalosa [e evidente!] vontade de manipular a opinião em Portugal a fim de eternizar-se quanto puder à frente dos destinos do País e estivesse de facto interessado em mudar, através das instituições "europeias", o que quer que fosse, teria obviamente accionado a figura do "debate com resolução".

E é exactamente isso o que está mal nas "demomorfias ocidentais" e lhes permite passarem sem sê-lo realmente por democracias genuínas: a possibilidade que dão a quem não pretender minimamente [parecendo, todavia, sempre dá-lo!] dar o salto qualitativo das meras... "aparências funcionais" para a efectividade e a genuinidade de uma Democracia" legítima


NOTA
[1] É um parênteses mas já repararam que o acordo em causa é também, além de "ortográfico" fonético e disfarçadamente normativo?

Supostamente, deveria servir para uniformizar [feia palavra e mais do que debatível conceito!] uns quantos vocábulos do português.

A verdade, porém, é que, por exemplo, eu quiser, no caso vertente, pronunciar "áqueta" [e tenho obviamente legitimidade linguística para fazê-lo] o tal "acordo" impede-mo, impondo-me uma grafia---a que Rui Tavares utilizou---que coloca a minha loiberdade articulatória implicitamente "fora da lei"

Eu não tenho, juro, quaisquer manias persecutória e não sou tentado a ver nisto, i.e. nesta imposição de uma fonética com a subtendendida redução objectiva, material, da minha liberdade de utilizar a língua ou seleccionar livremente possibilidades idiolectais senão um efeito secundário, um "backfire" objectual da incompetência manifesta de quem "acordou".


Agora que a redução da liberdade existe, ai, isso é evidente!

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